6 - So, I'm already gone


Entrei no meu prédio ainda meio perplexa com a ousadia de Ben em resolver tocar no assunto do nosso relacionamento agora, no final do dia. Eu continuava a repetir na minha cabeça o dia em que resolvi por um ponto final no nosso namoro.

- Ben, nós precisamos conversar.
- ...
- Ben, você está me ouvindo?
- Só um momentinho, princesa. – Eu odiava quando ele me chamava assim. Mas ele simplesmente não parava. – TOUCHDOWN! – Odiava mais ainda quando ele me ignorava por causa de algum jogo idiota da tv. Mas o que eu tinha a fazer era sério e eu jurei a mim mesma que não perderia a paciência. Me aproximei de onde ele estava no sofá, e preferi sentar-me na mesinha de centro, de frente para ele e de costas para a televisão. Assim ele seria obrigado a prestar atenção em mim.
- Benjamin?- Ele finalmente tirou os olhos da televisão e me encarou pela primeira vez.
- Você me chamou de Benjamin. O que aconteceu?
- Ainda não aconteceu nada. Mas eu precisava chamar a sua atenção de alguma forma.
- Ann, que cara é essa? Você está me deixando preocupado...

- Boa tarde, Dane. – Disse ao meu porteiro quando passei por ele.
- Boa tarde, Miss Borges. – Americanos e sua formalidade enrolando a língua para falar meu sobrenome brasileiro... Dessa vez eu realmente não liguei. Fui para o hall do elevador e apertei o botão.

- Eu... eu não sei como começar a falar isso. Mas eu tenho que falar.
- Anne... – Então ele também resolveu não me chamar pelo apelido. Posso começar a falar, finalmente.
- Deixa eu falar de uma vez, depois você argumenta, por favor. – Ele fez que sim com a cabeça e se calou.
- Ben... Você sabe que eu te amo. – Ele sorriu, aparentemente aliviado. - Mas, já faz algumas semanas que eu venho me perguntando se esse amor que eu sinto por você é suficiente para nós mantermos um relacionamento – O sorriso dele se desmanchou e a expressão que ele adquiriu no lugar foi uma que eu nunca havia visto antes.
- E a qual conclusão você chegou? – Ele disse, tristeza exalando na sua voz.
- Não é, Ben. Eu te amo, mas te amo como amigo. Acho que nós cometemos um erro quando resolvemos trocar o status do nosso relacionamento de amizade para namoro. Eu tinha acabado de me mudar para Los Angeles, estava com saudades de casa, saudades da minha família, saudades do meu país e você foi a primeira pessoa daqui que me acolheu. – Ele começou a chorar. – Eu acho que me apeguei demais a você e confundi as coisas. Te peço milhares de desculpas por isso. Mas eu simplesmente não consigo mais continuar do jeito que estamos. – Achei que devia omitir a parte em que eu dizia que ele não prestava muita atenção em mim. – Eu preciso de um tempo sozinha, um tempo só pra mim. E eu queria muito, muito mesmo que a nossa amizade continuasse. – Ele não falou nada. Continuou com a cabeça jogada contra o encosto do sofá, olhando para o teto enquanto chorava.
- Ben? Fala alguma coisa.
- Falar? Falar o quê, Anne? – Ele se levantou, caminhou para trás do sofá e aumentou o tom de voz. – Parece que você decidiu tudo sozinha, não? Eu achava que num relacionamento, as pessoas conversavam antes de tomar decisões sérias, que as pessoas entravam num acordo. Mas pelo visto, você não.
- Ben, não há acordo que deixe nós dois satisfeitos dessa vez. – Ele estava exaltado. Nunca o havia visto desse jeito.
- Exatamente, Anne. Você vai sair daqui, vai entrar no seu carro, voltar para casa e viver normalmente com as suas amigas brasileiras. Sou eu que vou ficar aqui, triste, chorando pelos cantos. – Como ele podia pensar isso de mim? Eu tinha certeza que eu ia ficar que qualquer forma, menos bem.
- Pelo amor de Deus, Ben. Você acha que é fácil vir aqui e falar essas coisas para você? Qual pedaço do eu te amo que eu falei mais cedo você não entendeu? – Dessa vez ele gritou com todas as forças entre as lágrimas.
- Me ama? Se me ama por que está fazendo isso? – Foi a minha vez de começar a chorar. – Responde, Anne!
- Você não entendeu metade do que eu disse. Eu estou fazendo isso por mim, por que eu não tenho mais condições de continuar, e por você, por que se nós continuarmos desse jeito, eu ia começar a ser completamente desonesta com você. – Eu estava começando a perder o controle, e então nós estávamos brigando. - O que você queria? Que eu começasse a inventar desculpas quando você me chamasse para sair? Que eu começasse a inventar dores de cabeça e trabalhos para fazer em casa? Eu estou sendo honesta. Você queria o contrário, é isso? – Ele ficou me olhando sem falar nada por alguns segundos.
- Anne, vai embora. – Ele disse quando voltou a se sentar no sofá e ver o maldito jogo de futebol na televisão.
- Então é assim que as coisas vão terminar, Ben? – Ele não respondeu, como se eu não tivesse ali. – Ok. Eu vou embora, já que é dessa maneira super madura que você quer resolver as coisas. – Eu comecei a andar em direção à porta, mas lembrei de uma coisa antes. Num ímpeto, arranquei o cordão que ele havia me dado do pescoço e joguei em cima dele no sofá. Ele nem moveu os olhos. Aí sim eu fui embora, e ao contrário do que ele disse, chorei até o caminho de casa e quando cheguei, Isabella e Julie passaram horas tentando me acalmar.

- A senhora tenho-um-encontro-com-o-meu-ex chegou! – Senti um dejavu quando abri a porta e encontrei as meninas na sala depois de ter me encontrado com Ben. Só que dessa vez eu não estava chorando desesperadamente.
- Eu aí chuchu, como foi o almoço? – Isabella perguntou.
- Foi... foi bom. A comida estava ótima.
- Você sabe que nós não queremos saber da comida, né, Anne? – Julie rebateu.
- Julie, espere pela minha vingança. E eu estou falando sério. Eu não queria ter ido nesse almoço e até dez minutos atrás tinha esquecido da minha promessa de vingança.
- E o que aconteceu para você lembrar dela mais uma vez?
- Ben tentou voltar comigo.
- Como assim, tentou voltar com você? Ele te beijou? – Bella estava perplexa.
- Eu não fiquei no carro tempo suficiente. Mas ele disse que nós podíamos tentar de novo. E quando eu neguei, ele disse que não ia desistir de mim. E seja lá o que isso signifique, eu não gostei.
- E agora nós vamos trabalhar praticamente juntos... Vai ser complicado. – Julie falou.
- De qualquer forma, foi bom eu ter ido para saber que ele ainda tem esperanças de retorno. E foi bom nós termos nos encontrado para eu saber que ele está na produção desse filme e não me deparar com ele no set no início as filmagens e não entender nada. – Vou ter mais compaixão na sua vingança, Julie. – Eu falei rindo, enquanto me sentava e jogava uma almofada nela. – Mas, então, me contem... Ouvi dizer que vocês conheceram um tal de Josh hoje...
- AAAAAAAAAAAAAANNE, meu senhor, como ele é lindo! Como ele é fofo, super simpático! – Isabella começou a surtar. Normal. Esperado. Julie levantou do meu lado e se juntou a ela.
- Aquele maxilar, cara. Tive que me controlar para não pular no pescoço dele e dar uma mordida! – Ela falou isso e eu me senti estranha, não sei o porquê.
- Julie, se controla, nós estamos trabalhando, ok? – Eu mesma tinha que lembrar disso a todo instante.

Elas passaram mais alguns minutos falando de como o Josh era isso e de como o Josh era aquilo. Eu compreendia completamente. Fiquei exatamente desse jeito depois que o conheci. Mas enquanto elas falavam dele, eu só conseguia lembrar dos nossos três encontros de hoje cedo. O primeiro, quando ele foi incrivelmente fofo e veio falar comigo antes do brunch. O segundo, já não tão agradável, quando ele veio me apresentar à Vanessa. E o terceiro, no restaurante, quando ele veio pedir desculpas pela brincadeira dela e achou que eu estava namorando com Ben. E quando ele disse, pela segunda vez, que eu estava linda. Eu não consegui conter um suspiro. Meu Deus do céu, o que estava acontecendo comigo?

- Anne? Anne, você está aí? – Julie estalava os dedos na frente do meu rosto.
- Oi. Desculpa meninas, eu estou um pouco cansada. Vou tomar um banho e tentar relaxar um pouco.
- Ok baby.
- Ah, só para constar, vocês não foram fazer compras com a Lindsey não, né?
- Claro que não! Você achou mesmo que nós iríamos sem você?
- Menos mal, hum.
- Isso aí na voz dela é ciúme, Isabella?
- Eu acho que é sim, Julie...
- Eu, com ciúmes de vocês? Não viajem, meninas, por favor.
- Isso Anne... Negação é o primeiro passo para a aceitação. – Isabella brincou e nós três começamos a rir. Como eu amava aquelas meninas...
- Eu vou tomar banho, que é o melhor que eu faço, viu...

Entrei no chuveiro e fiquei um bom tempo com a água quente caindo na cabeça, tentando entender tudo o que havia acontecido naquele dia, tentando assimilar Josh, Ben e trabalho. Tentando entender o que tinha acontecido para eu fugir para o banheiro do hotel e o que raios foi aquilo que aconteceu com Josh no restaurante.

Nesse momento, ouvi um grito estridente vindo da sala.

- AAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAANNE, VEM AQUI AGOOOOOORA! – Eu não consegui nem reconhecer  de quem era a voz, mas pela urgência, alguém devia estar morrendo. Quando cheguei na sala e encontrei Isabella e Julie vivas e inteiras na frente do computador, me perguntei o que podia ser tão importante para me gritar daquela forma.
- Como vocês ousam interromper o meu banho sem estarem morrendo? – Falei brincando.
- Anne, tem certeza que não aconteceu mais nada no restaurante em que você almoçou com o Ben? – Julie me perguntou, séria.
- Mais alguma coisa tipo o que?
- Tipo você conversando com o Josh. – Foi a vez de Isabella falar. Eu gelei e devo ter ficado tão branca quanto a minha toalha. Sentei ao lado dela e ela me mostrou a tela do notebook com uma foto de Josh com uma mulher num restaurante. O rosto dela estava coberto pelos cabelos escuros. A princípio, não entendi nada, mas lembrei que agora, meus cabelos eram negros e reconheci a roupa de Josh. Algum fotógrafo tirou essa foto hoje, quando ele foi até a minha mesa. Quando li a manchete, quase caí para trás.

“Josh Hutcherson é visto em almoço romântico com morena misteriosa num restaurante de Los Angeles hoje!”

Não consegui ler mais nada. Para falar a verdade, não precisava ler mais nada. A tirar pela manchete, aquela nota só ia dizer que Josh provavelmente estava com uma namorada nova. Mas pelo amor de Deus, o menino ficou cinco minutos na minha mesa e já tinha virado meu namorado?

Expliquei a situação para as meninas, disse que ele havia me reconhecido e tinha ido me cumprimentar, e só. Aquela foi a gota d’água. Já tinha acontecido coisa suficiente para um dia só, e eu só precisava de um motivo para descontar a minha raiva em alguém que merecesse. E o editor desse site me parecia uma boa opção. Fui até o meu quarto buscar meu celular na bolsa e quando cheguei na sala de novo e estava pronta para pegar o telefone de contato da redação do site e fazer o telefone passar de mão em mão até chegar no responsável por aquela nota ridícula se fosse preciso, ele tocou. Eu não tinha aquele número na minha agenda, não estava identificado. Atendi no calor do momento.

- Alô? – Minha voz saiu menos amigável do que eu pretendia.
- Anne? – Eu parei o que estava fazendo no exato momento em que ouvi a voz da pessoa do outro lado da linha.
- Josh, é você?

Música do capítulo: 
Already Gone, Kelly Clarkson
http://www.vagalume.com.br/kelly-clarkson/already-gone-traducao.html

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